
Irving Thalberg e Norma Shearer formaram uma espécie de casal real de Hollywood nos anos 1930. Ele, o maior produtor de seu tempo, conhecido como o “menino prodígio” da indústria cinematográfica. Ela, uma das atrizes mais reconhecidas e premiadas da década. Em um casamento de nove anos, os dois se tornaram indissociáveis e estabeleceram uma das grandes parcerias da história do cinema.
Thalberg tinha pressa de viver. Nascido em Nova York em 1899, veio ao mundo com um problema no coração e os médicos prognosticaram que ele não chegaria aos 30 anos. Aos 17 contraiu febre reumática, que o deixou de cama por um ano, período em que se tornou um ávido leitor. Aos 25, teve o primeiro ataque cardíaco.
Iniciou a carreira no escritório nova-iorquino da Universal Pictures, logo se tornando secretário particular de Carl Laemmle. Com apenas 20 anos, foi nomeado gerente de estúdio em Los Angeles, posto cuja criação ele mesmo sugerira a Laemmle. Após três anos, em 1922 conheceu Louis B. Mayer, que o contratou como vice-presidente encarregado da produção do seu pequeno estúdio. Em 1924, a Louis B. Mayer Productions se uniu à Metro Pictures e à Goldwyn Pictures, formando a Metro-Goldwyn-Mayer, da qual Thalberg se tornou coproprietário. Sua juventude, sua firmeza e sua capacidade de aliar qualidade artística e sucesso comercial, escolher boas histórias e cultivar novos astros chamavam a atenção de todos e, em poucos anos, fizeram da MGM o estúdio mais poderoso de Hollywood.


Nascida em Montreal em 1902, Norma chegou a Nova York em 1920 com a mãe e a irmã (Athole, que trabalhou em alguns filmes naquele ano e mais tarde foi casada com o diretor Howard Hawks). Com pernas atarracadas e estrabismo no olho esquerdo, foi rejeitada no início, mas persistiu e em breve começaram a surgir trabalhos como extra em filmes e como modelo fotográfico. Em 1923, recebeu propostas da Universal, da Hal Roach Productions e de Mayer. Seu agente recomendou que ela aceitasse a última. Mas, quando chegaram a Los Angeles, eles descobriram que as três propostas haviam sido feitas por Thalberg, que, ao deixar Laemmle, cogitou ir trabalhar com Roach e indicou o nome de Shearer a ele, mas acabou indo para o estúdio de Mayer. Ao encontrar o jovem produtor pela primeira vez, Norma o confundiu com um office boy. Sua atuação em Ironia da sorte (He Who Gets Slapped, 1924), fez dela uma das primeiras estrelas da MGM, ao lado de Lon Chaney e John Gilbert.
Sempre obstinada, Shearer fazia visitas frequentes à sala de Thalberg para exigir melhores filmes e papéis. Ele escutava e pedia calma à atriz, mas ficava impressionado com a sua determinação. Mesmo ciente dos problemas de saúde do chefe, Norma admirava a sua autoridade e graça. Deu match.
Em junho de 1925, ele a convidou para acompanhá-lo à première do filme Em busca do ouro (The Gold Rush), de Charlie Chaplin. Foi a primeira vez que os dois foram vistos juntos publicamente. Semanas depois, Shearer confidenciou a uma amiga que estava apaixonada. Porém, o relacionamento demorou a engrenar e, durante dois anos, eles continuaram tendo outros parceiros. Até que, em 1927, Irving enfim pediu a Norma em casamento. Existem duas versões sobre o pedido. O site oficial da atriz afirma que ele ocorreu na casa noturna Cocoanut Grove. Já a segunda versão diz que certo dia ela foi chamada à sala do produtor e o encontrou sentado na mesa diante de uma bandeja cheia de anéis de diamante, pedindo que ela escolhesse um. Norma escolheu o maior.
Então Norma se converteu ao judaísmo e, no dia 29 de setembro de 1927, eles se casaram em Beverly Hills, numa cerimônia oficiada por Edgar Magnin (o “rabino das estrelas”), tendo Mayer como padrinho. A lua de mel foi em Monterey, Califórnia.

O enlace deu a Norma o status de primeira-dama da MGM. É fácil tirar conclusões precipitadas e deduzir que ela e Thalberg se casaram por conveniência – e é inegável que o casamento trouxe benefícios profissionais para ambos –, mas os fatos indicam o contrário. As correspondências durante o noivado, a união e a vida familiar mostram um casal apaixonado. Os dois já eram bem-sucedidos quando começaram a namorar. Norma sempre foi dedicada e chegou a interromper a carreira mais de uma vez para cuidar do Irving quando ele esteve doente. Além disso, sempre foi talentosa, esforçada e buscou se aprimorar.
Um bom exemplo disso é A divorciada (The Divorcee, 1930). Joan Crawford era a opção original para protagonizar o filme. Norma se interessou pelo papel, mas Irving achava que ela não tinha o sex appeal necessário (se o casamento não acabou aí, é sinal de que se amavam muito!). Então ela preparou um ensaio sensual com o fotógrafo George Hurrell e convenceu o marido. Meses depois um Oscar de Melhor Atriz passou a enfeitar a lareira dos Thalberg.
Mas Irving não se furtava a satisfazer os desejos da esposa. Quando ela disse que gostaria de interpretar Maria Antonieta, ele tratou de comprar os direitos da biografia da rainha francesa escrita por Stefan Zweig. Maria Antonieta (Marie Antoinette, 1938) só foi concluído após a morte de Thalberg, mas foi um grande sucesso de público da carreira de Norma, dando a ela a última das suas seis indicações ao Oscar.
O casal teve dois filhos: Irving Jr., nascido em agosto de 1930, e Katharine, em junho de 1935. Quando teve Katharine, Norma chegou a pensar em aposentadoria, mas Thalberg a convenceu a seguir em frente – ainda assim a gravidez interrompeu a produção de Maria Antonieta. Irving, que chegava a trabalhar dezesseis horas por dia, fazia questão de brincar com as crianças antes de sair e frequentemente as levava para o estúdio para ficar mais tempo com elas.

Em 1932, a relação de Thalberg e Mayer havia se deteriorado, graças às visões diferentes de produção e ao crescente poder de Irving, que despertava a inveja do chefe. Após uma altercação com o estúdio, Thalberg conseguiu um aumento em sua participação nos lucros, mas no final do ano sofreu um novo ataque cardíaco.
Os médicos recomendaram um longo período de férias para Irving se recuperar. Em março de 1933, ele e Norma embarcaram em uma viagem para a Europa, da qual retornaram em agosto. Mayer aproveitou a ausência para eliminar o cargo de chefe de produção e criar unidades, contratando David O. Selznick (seu genro) e Walter Wanger. Quando Thalberg voltasse, seria como produtor de uma dessas unidades, mas ainda com prioridade na escolha de projetos e no acesso aos recursos. Com isso ele continuou produzindo muitos dos principais lançamentos da MGM, como O grande motim (Mutiny on the Bounty, 1935), que ganhou o Oscar de Melhor Filme.

No feriado do Dia do Trabalho (que nos EUA é comemorado na primeira 2ª feira de setembro) de 1936, os Thalberg tiraram uma folga em Monterey, ficando no mesmo hotel onde haviam passado a lua de mel. O ritmo incessante de trabalho estava pesando na saúde já frágil de Irving. Ele pegou um resfriado que em pouco tempo evoluiu para uma pneumonia – algumas fontes também atribuem o adoecimento à decepção com Romeu e Julieta (Romeo and Juliet, 1936), seu último filme lançado em vida e estrelado por Norma, no qual a MGM investira um grande orçamento, mas não tivera o retorno esperado.
Irving faleceu no dia 14 de setembro, aos 37 anos, quinze dias antes do nono aniversário de casamento. Sua morte foi um choque para todo o mundo do cinema. O último filme em que ele trabalhou, Terra dos deuses (The Good Earth, 1937), lançado postumamente, foi o único em que seu nome apareceu nos créditos.
Norma também teve pneumonia. Ao se recuperar, descobriu que a MGM havia deixado de pagar a percentagem de Thalberg nos filmes. Então contratou um advogado e levou a história à colunista de fofocas Louella Parsons, forçando o estúdio a retomar o pagamento e renovar o contrato da atriz para mais seis filmes, a 150 mil dólares cada.
Com Idílio a muque (Her Cardboard Lover, 1942), Norma cumpriu o contrato e deu fim à carreira. Porém, mesmo longe das telas, continuou ligada ao cinema, frequentando eventos e ajudando a revelar novos atores, como Janet Leigh. Ainda em 1942, ela se casou com o instrutor de esqui Martin Arrougé, doze anos mais jovem. Os dois permaneceram juntos até a morte dela, em junho de 1983, aos 80 anos.

O escritor F. Scott Fitzgerald era fascinado pelos Thalberg. Seu conto Domingo louco (1932) é inspirado em uma festa dada pelo casal. Já o protagonista do seu romance inacabado O último magnata, publicado em 1941, é baseado na figura de Irving.
Irving Jr. foi professor de filosofia na Universidade de Illinois em Chicago e publicou dois livros. Morreu em agosto de 1987, dias antes de completar 57 anos.
Katharine se formou em literatura inglesa e durante muitos anos foi dona de uma livraria em Aspen, Colorado, além de ativista dos direitos dos animais. Morreu em janeiro de 2006, aos 70 anos.

